O Brasil continua sem alcançar as metas de alfabetização infantil. Segundo dados mais recentes do Ministério da Educação, apenas 56% das crianças do 2º ano do Ensino Fundamental atingiram o nível adequado de leitura e escrita em 2023. O índice é bem abaixo do objetivo estipulado pelo governo federal, que pretende chegar a 80% até 2030. Especialistas apontam que a raiz do problema não está apenas na sala de aula, mas no sucateamento histórico do ensino infantil e de base e na priorização do ensino universitário nas políticas públicas.
O contraste: universidades fortes, escolas básicas frágeis
Nas últimas décadas, o Brasil investiu massivamente no ensino superior, ampliando universidades federais, programas de bolsas como ProUni e FIES e expandindo institutos federais. Por outro lado, creches, pré-escolas e escolas fundamentais — etapa onde ocorre a alfabetização — continuam com salas superlotadas, falta de professores qualificados, baixa infraestrutura e carência de materiais pedagógicos. Esse desequilíbrio de prioridades explica, em parte, o atraso brasileiro em relação a países vizinhos.
A formação do voto e do cidadão
O impacto desse déficit ultrapassa a sala de aula. Jovens chegam à idade do voto com dificuldades de leitura, interpretação de texto e compreensão de debates políticos. Para especialistas, um eleitor pouco alfabetizado tende a ser mais vulnerável à desinformação e à manipulação, comprometendo a qualidade da democracia. “Sem uma base sólida de leitura e escrita, o jovem tem menos autonomia para analisar criticamente propostas, discursos e notícias”, avalia o educador e pesquisador José Almeida.
Estrutura precária no ensino infantil
Dados do Censo Escolar apontam que apenas 40% das creches públicas no país têm biblioteca ou sala de leitura. Na pré-escola, quase um terço das turmas excede o número recomendado de alunos por professor. Segundo o Todos Pela Educação, os estados que mais avançaram em alfabetização são justamente aqueles que investiram em formação continuada de docentes e acompanhamento pedagógico intensivo nas séries iniciais.
Caminho para reverter o quadro
Para especialistas, é preciso inverter a lógica atual: priorizar a primeira infância e os anos iniciais do ensino fundamental, garantindo professores bem formados, materiais de qualidade e infraestrutura adequada. “Investir em universidade é importante, mas é na alfabetização que se forma o cidadão que terá condições de decidir seu futuro e o do país”, afirma a pedagoga Maria Souza.
O desafio
O novo Plano Nacional de Educação, em discussão no Congresso, prevê metas específicas para alfabetização e acompanhamento anual do progresso dos municípios. Mas, sem mudança estrutural de prioridades, o Brasil corre o risco de continuar formando gerações com déficit de leitura e escrita — um problema que impacta diretamente a democracia e a cidadania.